São João passou por aqui! Conheça baianos que fazem tradições juninas resistirem

Publicado em

Tempo estimado de leitura: 7 minutos

Para o povo nordestino, São João é santo, mas também reencontro com a infância, memória afetiva e estado de espírito. A comemoração católica veio de Portugal, ainda no século XV. No Brasil, virou festa da colheita do milho e, por isso, se adaptou muito bem à zona rural do Nordeste. Em face da urbanização, associada à violência e aos grandes eventos promovidos pelas prefeituras, os festejos juninos têm enfrentado um processo de descaracterização, mas, apesar disso, ainda é a festa mais popular do país. A resistência vem de pessoas que mantêm a tradição abrindo suas casas, percorrendo as ruas com trios de forró, levando animação pra todo mundo. O que importa é ter a certeza que São João passou por aqui!

VAI CURTIR O S�?O JO�?O NA BAHIA? CLIQUE AQUI E VEJA GUIA COMPLETO DOS FESTEJOS

Família unida 
�??Meu São João é sagrado!�?�, avisa Zana Tourinho, de 64 anos, que herdou dos pais a empolgação pelos festejos juninos. Morando em Salvador, em junho ela pega o caminho de Amargosa, onde viveu por 16 anos. Lá, mantém uma casa com o marido e, nesse período, recebe amigos para a festa organizada pela família. Todo mundo contribui. �??Fazemos o orçamento, dividimos os custos e realizamos o evento dentro de casa, na porta da rua, e onde der para  acontecer. Isso com muito amor, alegria e é, claro, um licorzinho�?�, brinca. Tem até música personalizada, o �??Forró da gente’. Também tem churrasco. �??Antes, íamos de casa em casa, mas, devido a violência, infelizmente, deixamos de ir�?�, lamenta Zana. A festança começa no dia 23, véspera de São João, e se entende até o dia 25.

Expectativa
Para a ireceense Ana Maria Dourado Pimenta, 58, o São João é o momento mais aguardado do ano. Quituteira de mão cheia, ela prepara, entre outras delícias, amendoim cozido, biscoitinhos, bolos de aipim e de fubá. A sustança fica por conta do mocotó e do sarapatel, que acompanham os licores também produzidos por Ana. O alpendre da casa foi adaptado para a festa, que é decorada com oratórios, bandeirolas, balões coloridos e toalhas de chita nas mesas. Chamam atenção os estandartes com as imagens dos santos juninos: Santo Antônio, São João e São Pedro, �??Eu faço tudo. Comecei essa tradição em nossa família há mais de três décadas�?�, afirma. Depois de dois anos sem comemorar, devido a pandemia, agora ela espera os amigos, os parentes e os filhos que moram em Salvador. A filha,Thiala Karina Dourado dos Santos, 33, vai levar reforços: �??Vão comigo meu noivo e umas dez pessoas da família dele�?�, avisa. 

Olha o Coelho!
Aloma Brito Cardoso e Silva Coelho, 40, celebrava o São João com a família desde criança, quando morava em Ilhéus. Ao se mudar para Santo Antônio de Jesus, onde vive com o marido e os três filhos, manteve a tradição. �??Todo ano a gente faz o Forró da Toca. �??Toca�?? é o nome da minha casa, uma referência a �??Coelho�??, que é o sobrenome do meu esposo�?�, ressalta. São quase 10 anos da festa, que foi suspensa por conta da pandemia. No ano passado, a saudade foi tanta, que a comunicóloga decidiu realizar um evento virtual mesmo. �??Fiz roupa caipira, botei a família vestida igual; decorei a casa; coloquei Dorgival Dantas e Elba Ramalho pra tocar; dançamos e brincamos só nós cinco�?�, relembra. Para sentir a presença dos amigos e familiares, Aloma e o marido ligaram pra todo mundo: �??Foram muitas videochamadas. Quem estava desanimado, acabou se animando�?�, garante. Esse ano, para alegria geral, o Forró da Toca voltou ao modelo presencial. 

Fanilia Coelho Aloma Brito com o marido e os filhos arquivo pessoal

Família Coelho (Foto: Acervo pessoal)

Devoção
Fernando Pinto, 64, é devoto de Santo Antônio. A trezena organizada por ele já virou tradição em Rio de Contas, na Chapada Diamantina. No mês de junho, Fernando abre a casa antiga no Centro, onde mora com a família para receber vizinhos, amigos e até turistas. Tem forró e fogueira na porta. A mesa vai para a calçada, cheia de delícias: bolos de batata, aipim, arroz e milho, mugunzá e mingau. Quem for passado pode pegar, sem cerimônia. As muitas opções de licores, produzidos por ele e pela esposa, também chamam atenção. Este ano, o fuá vai contar com uma nova integrante da família: �??Estou ansioso para conhecer minha netinha Ana Clara. Depois da pandemia, só tenho a agradecer por estarmos bem�?�, celebra. 

Interior na capital
Em Salvador também é possível encontrar os tradicionais festejos juninos. Na Ribeira, para ser mais precisa. �? lá que moradores como Mario Agra, 64, celebram, há décadas, o São João como se deve: com comidas típicas, bandeirolas, muito licor e casa aberta. Tudo começou com a mãe do petroquímico aposentado e se firmou com o irmão dele, Aloisio Agra, conhecido como Lulu, que saía pelas ruas da Ribeira tocando acordeon junto aos amigos, com a Barca do Lulu. Com o falecimento do irmão, Mario acabou dando continuidade à tradição familiar. Com a pandemia, a farra se resumiu à garagem de casa. Esse ano, ele volta a juntar todo mundo, com muito forró pé-de-serra. �??Como sempre, vai ter Luiz Gonzaga, Genival Lacerda, Sandro Becker. �? pra todo mundo entrar no clima�?�, avisa Mario Agra. 

De mãe pra filha
Para a felicidade de Laura Fernandes, 34, a comemoração na fazenda do tio Almir, em Ipirá, foi retomada agora em 2022. Há cinco anos, a festa, que acontecia há três décadas, tinha dado uma pausa. �??�? um momento que amo e não aguento ficar sem o contato com essa tradição�?�, entrega ela.

Laura quando tinha 2 anos Arquivo pessoal

Laura curtindo o São João aos 2 aninhos (Foto: Acervo pessoal)

Desta vez, a celebração foi a Santo Antônio. Laura levou o marido e a filha de dois anos, pela primeira vez. A pequena usou o vestidinho caipira que a mãe vestiu quando tinha a mesma idade. Como no passado, a jornalista e empresária encontrou cestos de amendoim, milho assado na fogueira, canjica e trio tocando forró. O coração-São João bateu mais forte: “Foi muito emocionante ver minha filha descobrindo esse universo da roça, o que é boi, bode, galinha, andando de cavalo com o pai, foi a coisa mais linda do mundo. Me vi nela também�?�.

Cecilia 2 anos com o vestido que a mae Laura usou com a mesma idade arquivo pessoal

Cecília, também aos 2 anos, curtindo o São João (Foto: Acervo pessoal)

Disposição e animação
O São João não chegou a ser uma tradição na família de Leandro Medeiros, 31. Mas, isso não o impediu de desenvolver paixão pelos festejos juninos. Em Paulo Afonso, ele vai de casa em casa para curtir as festas, no melhor estilo �??São João passou por aqui?�??. �??Não sou de multidão e nem de ir pra shows grandes. Gosto mais dessas atividades intimistas, que dá pra curtir a tradição e as pessoas�?�, afirma o bacharel em  Ciências Contábeis. Para ele, a festa precisa ter pamonha, canjica e bolo de macaxeira (ou aipim, aqui desse lado da Bahia). Em contrapartida, Leandro, que também é ator e dançarino, oferece toda sua desenvoltura para dançar os ritmos juninos. �??Quadrilha, xote, forró, baião, xaxado, tudo o que envolve a dança sempre me encantou�?�, conta ele, garantindo levar animação para onde for. Anarriê!

***

APROVEITA, GENTE!
�??Eu venho com o pau aceso / pra alegrar o seu São João/ Tô em riste, tô firme, tô teso/ Vou incendiar o seu coração�?��?? Quem passar o São João em Mucugê tem chance de se bater com um grupo bem animado pelas ruas, entoando forrós de duplo sentido. �? a Turma do Pau Aceso, amigos e agregados que se reúnem para os festejos juninos e levam alegria para moradores e turistas. A novidade esse ano é o quadriciclo elétrico ecológico, com melhor qualidade de som e menos resíduo para o meio ambiente. 

Turma do Pau Aceso Mucuge

Foto: Divulgação

Turma do Pau Aceso

23 de junho, 20h; 25 de junho, 15h

Concentração: Praça da Igreja Santa Isabel

Mucugê, Chapada Diamantina, a 455 Km de Salvador

@turmadopauacesomucuge

*****

Em 2022, a Zabumbada Irecê vem com gosto de gás, na celebração dos seus 10 anos. O tema deste ano é �??Forró – Patrimônio Imaterial do Brasil�??. Com a pandemia, claro, não teve a festa pelas ruas de Irecê, mas, esse ano, o grupo pretende colocar o forró em dia, com uma grande diversidade de artistas. O objetivo é disseminar a cultura nordestina, em especial o forró tradicional.

Zabumbada Irecê 

26 de junho, 13h

Concentração: Clube da AABB

Irecê, região Centro-norte, a 483 km de Salvador

@zabumbada.irece

*****

Mariangela e Bando Anunciador Amargosa

Foto: Divulgação

O Bando Anunciador Acorda Maria Bonita sai pelas ruas de Amargosa no dia 23 de junho, avisando que São João está chegando, distribuindo licor e tocando forró. Muita gente espera o grupo: �??Tem os que já ficam na porta, aqueles que vêm de outras ruas, e fazemos questão de passar para que os idosos também possam ver e se divertir�?�, afirma Mariângela Araújo de Souza, 53, idealizadora do Bando. 

Bando Anunciador Acorda Maria Bonita

23 de junho, 13h

Concentração: Shopping Valle, bairro Santa Rita

Amargosa, região Centro-sul, a 269 Km de Salvador 

@gruporevitalizar

*****

Bairro de Salvador com jeitinho de interior, a Ribeira abriga o Forró do Jegue, adaptação junina de uma manifestação carnavalesca que ocorria na Península de Itapagipe. O evento cresceu tanto que ganhou a Avenida Beira-Mar, onde está há 30 anos. As pessoas ainda vão de casa em casa e chegam caravanas de diversos locais da cidade. Tem quadrilha, trio e banda de sopro tocando só forró pé-de-serra. 

Forró do Jegue

23 de junho, 19h; 24 de junho, 14h; 25 de junho, 18h

Concentração: Em frente ao Coreto (próximo à Praia do Bogari), na Avenida Beira-Mar, Ribeira. Salvador

*Por motivo do recente aumento de casos de covid-19, o CORREIO volta a chamar a atenção para a necessidade da vacinação completa (de acordo com cada faixa etária) contra o novo coronavírus. Além disso, sugere o uso de máscaras apropriadas, a higienização das mãos e o cuidado com aglomerações.

Que você achou desse assunto?

ÚLTIMAS NOTÍCIAS

- Publicidade -

ASSUNTOS RELACIONADOS

Por que ler é importante para todos nós?

Tantas pessoas se interessam pela leitura, mas não conseguem uma conexão. A importância da leitura na infância, na juventude e na fase adulta são indiscutíveis, por isso enumero alguns motivos para você se encantar com os livros e com os benefícios que eles trazem. Ler...