Ao declamar poemas ao som do instrumento da lira, os poetas gregos inauguraram a tradição do canto lírico, importada da Europa e hoje presente em todo o mundo. O Caminhos da Reportagem deste domingo (5), às 22h, reprisa os desafios da profissão no Brasil, uma escolha que envolve muito estudo, prática, dedicação e luta para se destacar nesta arte.
A cantora lírica Chiara Santoro, formada pela Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UniRio) e com especialização no Conservatório Santa Cecília de Roma, atua como atriz e cantora em diferentes gêneros do canto lírico, como óperas, operetas e concertos de câmara. �??Eu gosto de contar histórias cantando�?�, resume. A quantidade reduzida de obras por temporada no Brasil acaba também exigindo dos artistas maior versatilidade. �??�? uma realidade aqui do canto lírico no Brasil ter que se dividir em muitas tarefas. A gente vai equilibrando, tipo malabarista�?�, brinca.
Em cartaz no Theatro Municipal de São Paulo com a ópera Navalha na na carne, baseada na peça de Plínio Marcos, o cantor lírico e professor da Escola de Música da UFRJ Homero Velho defende que, mesmo nos períodos em que está fora dos palcos, o cantor precisa estar sempre pronto, com a voz �??funcional�?�: �??�? o único instrumento que realmente é o nosso corpo, é muito difícil de a gente sentir o que está acontecendo lá dentro. Por isso, a prática diária é tão importante, ensina de maneira empírica como utilizar sua voz�?�.
Diante das dificuldades da carreira, muitos artistas ainda procuram no exterior oportunidades de trabalho e formação. A jovem cantora lírica Manuela Korossy é hoje aluna da Juilliard School, nos Estados Unidos, uma das mais renomadas escolas de performance do mundo. �??A coisa mais difícil de todo o processo de admissão, quando se tem segurança no seu preparo técnico, é vencer o estresse�?�, desabafa. De Bruxelas, a cantora lírica Priscila Olegário, que estudou na França, na Itália e na Bélgica, e já se apresentou em diferentes países da Europa interpretando protagonistas de óperas renomadas, como �??Carmen�?� e �??Aida�?�, conta que, ainda assim, encontra barreiras: �??Só o meu corpo e a minha face cantando lírico já são uma transgressão�?�, argumenta. �??Ainda hoje há países que fazem blackface. Isso para mim, é inaceitável�?�, diz Priscila, referindo-se à prática de caracterizar personagens brancos como se fossem negros, o que reforça esteriótipos racistas.
No Amazonas, o cantor lírico Miqueias William perseguiu o sonho de subir ao palco e soltar a voz inspirado nos três tenores – Luciano Pavarotti, Plácido Domingos e José Carreras -, que, na década de 1990, fizeram sucesso mundialmente. Miqueias tornou-se um dos idealizadores do Encontro de Tenores, que acontece há dez anos no Teatro Amazonas, em Manaus. Ainda hoje, ele diz que se emociona ao entrar no teatro: �??�? uma responsabilidade muito grande e é um privilégio�?�, descreve. �??Eu vim de um bairro humilde, meu avô era pescador, minha mãe uma professora. A gente não era de família rica, que se interessou por ópera e foi para Europa. Nada, foi tudo aqui mesmo�?�.
No Rio, o Colégio Pedro II tem a disciplina de música nos bancos escolares desde sua fundação, em 1837. �??A música tem um lugar. O lugar dela é na escola, é junto com os alunos�?�, acredita a professora de educação musical Cristina Cardoso da Fonseca.
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